09 junho, 2006

Carta da Mãe Portuguêsa...


Lisboa, Portugal
Querido filho:
Escrevo-te esta linha para que saibas que a mãe está viva!
Vou escrever bem devagar pois sei que não consegues ler depressa.
Caso estejas sem tempo de escrever para a mãe, manda uma carta dizendo que quando estiveres mais tranquilo vais mandar notícias.
Se tu viesses hoje aqui em casa não irias reconhecer mais nada, porque mudamos.
Temos agora uma máquina de lavar roupa.
Mas não trabalha muito bem.
Na semana passada pus lá 14 camisas, apertei o botão e nunca mais as vi.
Vai ver que esta marca "Vasos Sanitários Hydra" não é das melhores.
Tua irmã Maria está grávida.
Mas, ainda não sabemos se vai ser menino ou menina.
Portanto, não podemos te dizer se vais ser tio ou tia.
Teu pai arranjou um bom emprego.
Tem 2,300 homens abaixo dele.
É o responsável pelo corte da grama do cemitério.
Quem anda sumido é o teu tio Venâncio, que morreu no ano passado.
Lembra-te do teu tio Joaquim?
Então, afogou-se no mês passado num depósito de vinho.
Oito compadres dele tentaram salvá-lo mas o tio lutou bravamente contra eles.
O corpo foi cremado há duas semanas.
Levaram oito dias para apagar o incêndio.
Os engarrafadores de refrigerante aqui finalmente tiveram uma grande idéia de colocar uma indicação na tampinha, dizendo: "abra por aqui".
Isto facilitou-nos muito a vida.
Espero que os daí façam a mesma coisa.
Caso esteja difícil para ti, a mãe te manda algumas garrafas daqui.
Teu irmão, João, continua o mesmo de sempre.
Semana passada fechou o carro com as chaves dentro.
Perdeu um tempão indo até a casa dele pegar a cópia da chave, para poder tirar-nos de dentro do automóvel. Estava um calor de rachar.
Por falar em calor o tempo aqui tá muito estranho.
Esta semana só choveu duas vezes.
Na primeira vez choveu durante tres dias.
Na segunda vez choveu durante quatro dias.
Esta carta te mando através do Gabriel que vai amanhã para aí.
A propósito, será que podes pegá-lo no aeroporto?
Lembrei de uma coisa importante.
Terás um problema para falar com a mãe, caso decidas escrever-me.
Não sei o endereço desta casa nova.
A última família que morou aqui antes de nós, também era portuguesa e levou a placa da rua e o número da casa para não precisar mudar de endereço.
Se encontrares a Tereza, dê um alô da minha parte.
Caso não a encontres, não precisas dizer nada.
Adeus, tua mãe que te ama.

Fátima Manoela da Alcova

PS: Ia mandar-te 2.000 escudos, mas, fica prá outra vez.Já fechei o envelope!!!!!!

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